Páginas

sábado, 10 de outubro de 2015

O Tempo ou Para os meus amigos do Tijolo.


No meio do espetáculo. Olhares entre nós.
"Já que tu vai lá pra feira traga de lá para mim..."
A brincadeira é essa aqui, nos olharmos e olharmos quem está ali no teatro conosco. Deixar o ar passear tranquilamente entre nós. E passeou.
"eu quero matar saudade, faz tempo que fui na feira...ai, saudade!"
Faz muito tempo.
O tempo abriu em espaço suspenso. Olhei ao redor e vi a nós todos. Ali. O encontro de todos aqueles que começaram o Concerto lá atrás, na Mazzaropi. Mazzaropi agora fechada.
Mas não foi só isso. Vi a gente envelhecendo juntos e comecei a pensar do por quê escolhemos passar tanto tempo juntos. Pensei no motivo mais provável ou aceitável, de que nos entendemos como artistas, de que somos amigos, que temos horizontes parecidos. E pensei também na possibilidade do desconhecido, das perguntas sem respostas do por quê escolhemos estar juntos. Porque é isso. Passamos tempos preciosos juntos. Tempos de formação da individualidade e dentro do coletivo. Tempo na vida  Um período que recebemos essa espécie de marca d `água da vida.O tempo.
Durante esse tempo todos nós vimos alguns de nós terem filhos. Todos nós vimos alguns de nós casarem, descasarem. Vimos todos nós mudarem de casa. Vimos alguns mudarem de cidade.Vimos alguns de nós perderem  pais, mães,irmãs, tios, tias,primos, primas. Porque fica tudo misturado. Porque é assim: é uma escolha viver assim ( ia colocar a palavra "trabalho", "trabalhar assim" mas depois de descobrir que a palavra "trabalho " vem de tortura eu vou tentar evitá-la).
Olhei pra frente e vi um de nós recostado na pilastra da Sede da XlX. Outra sentada. Outra também. Vi a todos nós com mais cabelos brancos ou com menos cabelos, com mais rugas e nem por isso menos, ou melhor, por isso mesmo  talvez mais interessantes, mais bonitos. Sim, acho bonitos meus amigos ali. Vestindo a pele mais pesada que o tempo trás. Uma pele que talvez não queira mais perder tempo em exigir afirmações mas em endossar reflexões.
E fazia tempo.Todos que participaram das escolhas para a criação desse trabalho, assim, juntos. E, particularmente num espaço onde tem a presença de um amigo querido que veio de Santos comigo e chegou a morar com minha vó para vir fazer teatro aqui em São Paulo. Hoje brincamos no espaço que é dele também.
Acho que foram segundos. Os olhares. Talvez um minuto em que coube uma suspensão. Fiquei com vontade rir, de chorar. Chorei.
Sei que o texto é um pouco sentimental mas queria compartir desse sentimento que veio hoje. Assim mesmo, sem revisar, sem melhorar palavra, sem véu.
Penso que esse tempo demarca território dentro. E presenciar a vida do outro talvez seja também refletir um pouco a nossa.
É que veio forte.Essa sensação do tempo corrido. De outros carnavais.
Forte.


Para os meus amigos do Tijolo.

Karen Menatti.







Um comentário:

  1. foi tão-tão bonito, alumiou o sábado! o que em vocês reverbera, derrama em nós! ♥

    https://www.youtube.com/watch?v=2TJIQIPKIsQ

    ResponderExcluir